A vida imita a arte: Isso completa meu argumento
por Mark Weisbrot, no jornal britânico Guardian, em 16.07.2010
Tradução do Viomundo
É legal quando você faz um documentário sobre como a grande mídia distorce a realidade e a resposta da mídia ao filme comprova a sua argumentação. Na verdade, a resposta da mídia ao documentário South of the Border, de Oliver Stone, que eu escrevi com Tariq Ali, realmente completa alguns dos argumentos do filme.
O primeiro tem a ver com o desleixo e a falta de conhecimento que caracterizam o debate sobre as relações dos Estados Unidos e a América Latina, problemas com os quais a grande mídia regularmente contribui. Algumas das críticas ao filme foram marcadas pela dificuldade em acertar os presidentes e os países envolvidos. Talvez o exemplo mais relevante foi dado pelo Washington Post, que colocou uma foto do ministro de governo da Bolívia, Sacha Llorenti, identificando-o como “Evo Morales”. Llorenti é desconhecido nos Estados Unidos, mas aparece no filme como tradutor para o presidente Morales. Alguém no Post deve ter visto ambos no filme e deve ter chegado à conclusão que o cara mais branco falando inglês tinha de ser o presidente.
O ataque frontal de Larry Rother ao filme ocupou quase toda a primeira página do caderno de Artes do New York Times, com uma grande sub-manchete que dizia “Surgem questões sobre a precisão [do filme]“. No entanto, ele não conseguiu encontrar nenhum erro factual — apesar de algumas tentativas desesperadas de fazê-lo. Em uma delas Rother usou dados da importação de petróleo [venezuelano pelos Estados Unidos] de 2004 a 2010 para tentar desmentir um analista que aparece em um clipe de TV aproveitado pelo documentário, de abril de 2002. A fala de cinco segundos do especialista não tem nenhuma relevância, mas ainda assim Rother comete um erro.
Aqui, uma resposta detalhada a Rother, em inglês
Os erros cometidos nas resenhas foram muito numerosos para listar aqui. (Você pode votar em seu erro favorito aqui — Nota do Viomundo: no site Daily Kos, em inglês). Muitos críticos reforçaram a análise que o filme faz da mídia ao considerar toda a história em termos ideológicos e não entendendo os pontos mais substantivos. Por exemplo, o filme oferece cinco provas do envolvimento de Washington no golpe de 2002 que derrubou o presidente eleito da Venezuela, Hugo Chávez. Elas incluem um documento do Departamento de Estado reconhecendo que “o NED [National Endowment for Democracy], o Departamento de Defesa [DOD] e outros programas de assistência dos Estados Unidos deram treinamento, apoio institucional e de outro tipo para indivíduos e organizações que sabiam estar envolvidos ativamente na breve derrubada do governo Chávez”.
Isso, e outra documentação apresentada no filme — parte da qual nunca sequer chegou a ser divulgada na grande mídia [americana] — reforça a tese de que Washington esteve envolvida no golpe. Essa conclusão é apoiada por Scott Wilson, do Washington Post, que era editor internacional quando foi entrevistado por mim e que estava em Caracas durante o golpe.
Eduardo Porter, do conselho editorial do New York Times, também aparece no filme e faz referência ao apoio do governo Bush ao golpe: “Este incidente em particular foi a pior decisão possível que os Estados Unidos poderiam ter tomado. Não apenas trancou Washington na posição de inimigo eterno do governo Chávez como tornou difícil para qualquer outra pessoa na América Latina gostar dos Estados Unidos”.
Ainda assim tivemos milhares de artigos e reportagens sobre as relações dos Estados Unidos e da Venezuela nos últimos oito anos e quase nenhum sobre o papel dos Estados Unidos no golpe. Quando muito isso é mencionado como uma “acusação” feita por ninguém menos que Hugo Chávez — uma fonte demonizada — ou descartado como algum tipo de “apoio tácito”. A maior parte dos resenhistas do South of the Border também parece ter considerado essa questão e as provas apresentadas no documentário como irrelevantes.
Quando os resenhistas notaram a crítica que o filme faz à mídia, o problema foi atribuído à [rede de TV de extrema-direita] Fox ou outras emissoras de TV. Mas o documentário enfatiza que toda a grande mídia — não apenas a Fox ou as emissoras de TV — é que deu aos americanos uma impressão distorcida das mudanças históricas que aconteceram na última década na América Latina. Foi o conselho editorial do New York Times que abertamente apoiou a derrubada de um governo eleito democraticamente em 2002 — um ponto importante do filme. Isso também não foi notado, apesar do fato de que é que algo que o jornal mais importante dos Estados Unidos não fazia provavelmente nos últimos 30 ou 40 anos.
Não há surpresa no fato de que o filme atraiu a hostilidade característica dada a quem trata dessa questão [da mídia] (embora também tenha havido críticas positivas). A resenha do Los Angeles Times, que contém vários erros importantes, criticou o filme por não ter substância. Mas parece que a substância que o filme tem foi além do que a maior parte da mídia é capaz de lidar.
por Mark Weisbrot, no jornal britânico Guardian, em 16.07.2010
Tradução do Viomundo
É legal quando você faz um documentário sobre como a grande mídia distorce a realidade e a resposta da mídia ao filme comprova a sua argumentação. Na verdade, a resposta da mídia ao documentário South of the Border, de Oliver Stone, que eu escrevi com Tariq Ali, realmente completa alguns dos argumentos do filme.
O primeiro tem a ver com o desleixo e a falta de conhecimento que caracterizam o debate sobre as relações dos Estados Unidos e a América Latina, problemas com os quais a grande mídia regularmente contribui. Algumas das críticas ao filme foram marcadas pela dificuldade em acertar os presidentes e os países envolvidos. Talvez o exemplo mais relevante foi dado pelo Washington Post, que colocou uma foto do ministro de governo da Bolívia, Sacha Llorenti, identificando-o como “Evo Morales”. Llorenti é desconhecido nos Estados Unidos, mas aparece no filme como tradutor para o presidente Morales. Alguém no Post deve ter visto ambos no filme e deve ter chegado à conclusão que o cara mais branco falando inglês tinha de ser o presidente.
O ataque frontal de Larry Rother ao filme ocupou quase toda a primeira página do caderno de Artes do New York Times, com uma grande sub-manchete que dizia “Surgem questões sobre a precisão [do filme]“. No entanto, ele não conseguiu encontrar nenhum erro factual — apesar de algumas tentativas desesperadas de fazê-lo. Em uma delas Rother usou dados da importação de petróleo [venezuelano pelos Estados Unidos] de 2004 a 2010 para tentar desmentir um analista que aparece em um clipe de TV aproveitado pelo documentário, de abril de 2002. A fala de cinco segundos do especialista não tem nenhuma relevância, mas ainda assim Rother comete um erro.
Aqui, uma resposta detalhada a Rother, em inglês
Os erros cometidos nas resenhas foram muito numerosos para listar aqui. (Você pode votar em seu erro favorito aqui — Nota do Viomundo: no site Daily Kos, em inglês). Muitos críticos reforçaram a análise que o filme faz da mídia ao considerar toda a história em termos ideológicos e não entendendo os pontos mais substantivos. Por exemplo, o filme oferece cinco provas do envolvimento de Washington no golpe de 2002 que derrubou o presidente eleito da Venezuela, Hugo Chávez. Elas incluem um documento do Departamento de Estado reconhecendo que “o NED [National Endowment for Democracy], o Departamento de Defesa [DOD] e outros programas de assistência dos Estados Unidos deram treinamento, apoio institucional e de outro tipo para indivíduos e organizações que sabiam estar envolvidos ativamente na breve derrubada do governo Chávez”.
Isso, e outra documentação apresentada no filme — parte da qual nunca sequer chegou a ser divulgada na grande mídia [americana] — reforça a tese de que Washington esteve envolvida no golpe. Essa conclusão é apoiada por Scott Wilson, do Washington Post, que era editor internacional quando foi entrevistado por mim e que estava em Caracas durante o golpe.
Eduardo Porter, do conselho editorial do New York Times, também aparece no filme e faz referência ao apoio do governo Bush ao golpe: “Este incidente em particular foi a pior decisão possível que os Estados Unidos poderiam ter tomado. Não apenas trancou Washington na posição de inimigo eterno do governo Chávez como tornou difícil para qualquer outra pessoa na América Latina gostar dos Estados Unidos”.
Ainda assim tivemos milhares de artigos e reportagens sobre as relações dos Estados Unidos e da Venezuela nos últimos oito anos e quase nenhum sobre o papel dos Estados Unidos no golpe. Quando muito isso é mencionado como uma “acusação” feita por ninguém menos que Hugo Chávez — uma fonte demonizada — ou descartado como algum tipo de “apoio tácito”. A maior parte dos resenhistas do South of the Border também parece ter considerado essa questão e as provas apresentadas no documentário como irrelevantes.
Quando os resenhistas notaram a crítica que o filme faz à mídia, o problema foi atribuído à [rede de TV de extrema-direita] Fox ou outras emissoras de TV. Mas o documentário enfatiza que toda a grande mídia — não apenas a Fox ou as emissoras de TV — é que deu aos americanos uma impressão distorcida das mudanças históricas que aconteceram na última década na América Latina. Foi o conselho editorial do New York Times que abertamente apoiou a derrubada de um governo eleito democraticamente em 2002 — um ponto importante do filme. Isso também não foi notado, apesar do fato de que é que algo que o jornal mais importante dos Estados Unidos não fazia provavelmente nos últimos 30 ou 40 anos.
Não há surpresa no fato de que o filme atraiu a hostilidade característica dada a quem trata dessa questão [da mídia] (embora também tenha havido críticas positivas). A resenha do Los Angeles Times, que contém vários erros importantes, criticou o filme por não ter substância. Mas parece que a substância que o filme tem foi além do que a maior parte da mídia é capaz de lidar.
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