07/12/2010 - 07:49 | Natalia Viana | São Paulo
Não foram poucas as discussões sobre como publicar os 251 mil telegramas das embaixadas norte-americanas – sempre acaloradas e cheias de contrapontos, como é o processo decisório para cada passo dado pelo Wikileaks.
O grupo envolvido no projeto sabia que tinha em mãos um material muito diferente dos anteriores. Para quem não sabe, o Wikileaks já tem um bom tempo de estrada, e já publicou documentos seríssimos – desde denúncias contra a máfia russa até os famosos arquivos do Afeganistão.
Mas desta vez o mais importante na visão de Julian Assange era o alcance – os documentos dizem respeito a quase todas as populações do mundo – e a importância dos documentos.
Eles são muito mais do que uma simples denúncia sobre como os EUA atuam no mundo e que tipo de sujeira eles podem estar envolvidos. São um contundente documento histórico que deixa exposta a essência de uma era.
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Juntos, eles constroem uma narrativa de como a superpotência vê e atua em um mundo em mutação. Através deles, se pode ver de perto a narrativa diplomática sobre duas guerras falidas, uma guerra contra o terror igualmente fracassada, uma crise financeira como poucas na história, o início de uma nova ordem mundial com uma multiplicidade de nações surgindo como importantes atores globais.
Retratam, de dentro, as diferenças e semelhanças entre o governo de Bush e o de Obama. E refletem também uma crise ambiental sem precedentes, mostrando como os EUA atuaram ou deixaram de atuar por sua causa.
São o retrato de um império em decadência.
Como em lançamentos anteriores, o Wikileaks avaliou que precisava de parceiros de peso para dar substância ao material em um primeiro momento. Por isso os cinco grandes veículos - Le Monde, El País, The New York Times, The Guardian e Der Spiegel - foram contatados, e entraram na parceria com exclusividade.
São jornais reputados que têm a estrutura necessária para processar essa enormidade de informações e produzir reportagens a partir dela.
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Além disso, somente através desses parceiros, já conhecidos do Wikileaks, a organização poderia se certificar de que todos os telegramas que forem publicados – todos – irão passar por um rígido controle de redação final.
Cada jornal é obrigado a editar os documentos e retirar os nomes de pessoas que possam sofrer risco por causa do conteúdo dos documentos. Essa é uma preocupação central da organização.
Mesmo assim, estava claro que para eles o mais interessante seria os “furos”, o pote de ouro no fim do arco-íris do jornalismo mainstream.
Para equilibrar um pouco a cobertura e evitar uma corrida desenfreada pelo “furo”, o Wikileaks conseguiu negociar uma programação de matérias que serão publicadas ao longo das semanas por esses jornais. Assim, o conteúdo é melhor aproveitado e notícias de tamanha relevância podem ser digeridas por mais tempo.
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Além desses cinco veículos, o Brasil é o único país que tem tido a oportunidade de conhecer o conteúdo dos telegramas provenientes da sua embaixada e consulados. Isso porque o Wikileaks considera o público brasileiro como grande aliado. O Brasil tem um enorme número de internautas e um dos movimentos pela liberdade na internet mais ativo do mundo.
Por isso, a organização resolveu criar uma forma de comunicação direta com ele. Dessa forma, fui convidada, como jornalista independente, a colaborar com o projeto.
Ao longo da última semana, produzi algumas matérias em português no site para que o público pudesse ver como esse material é rico. Ao mesmo tempo, em parceria com a Folha de S. Paulo, esse material pôde chegar impresso em tempo real para os leitores brasileiros.
Segunda fase
Esta semana começa a segunda fase da divulgação. Agora, o Wikileaks vai trabalhar em parceria com dois dos maiores jornais do país – a Folha e O Globo – por meio de dois grandes repórteres, que buscarão dar o tratamento adequado ao material.
São centenas de histórias que merecem tempo, apuração e faro para serem bem escritas, e como o Wikileaks é uma organização pequena (embora grande), não tem condições de realizar todo o jornalismo sozinho. Contamos com os dois jornais para nos ajudar a narrar essa importante história.
Ao mesmo tempo, o site do Wikileaks continua com matérias de minha autoria em português em seu site. Todas elas, de acordo com a filosofia da organização – com a qual concordo – são licenciadas como creative commons. Usem, reproduzam e espalhem à vontade.
*Natália Viana é jornalista e colaboradora do Opera Mundi
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